quarta-feira, 5 de setembro de 2012

tinta amarela

a primeira tentativa foi um pé de manjericão. Ia crescendo bonito. Os olhos dela fitos nele. Ela nunca soube se foi olhado, mas secaram-se todas as folhas e também o fino caule. E morreu. Depois de um tempo, chegou em casa com um pé de hortelã miúdo. Não afeito ao sol forte da tarde, insistente na varanda, morreu. Cabisbaixa, fez mais uma experiência: uma kalanchoe com flores cor de rosa. Forte. Quase neon. Passou a floração, as flores secaram e caíram. As folhas, no entanto, resistiram mais duas estações, fazendo feliz o sorriso dela. Então, deparou-se com insetos minúsculos na terra. Na garantia do extermínio, exagerou no inseticida. A conclusão de sua fatídica inaptidão tomou-lhe a cabeça. E recusou-se a mais sofrer com tantas perdas. 
Certo dia, um toque de campainha levou-a, distraída, à porta. À sua espera, uma poinsettia vermelha. Linda. De súbito, esqueceu-se das antigas dores e levou, presente e presenteador, ao quintal. Escolheram o melhor lugar e prometeu cuidá-la bem. Lembrou-se do hortelã miúdo e abrigou-a da luz. Em poucos dias, a cor não era mais a mesma nem nasciam brotos. Pensou que completaria um mês, mas o vermelho enfeiou-se e se esvaiu. 
Envergonhada da promessa que a ele fizera, comprou sementes de girassol. E também tinta amarela. Pensou no pé de manjericão, no calor da varanda e na kalanchoe. Também no vermelho e nos brotos que não chegou a ver. Em sua última tentativa, plantou as sementes. E, temendo os nublados dias, pintou, na parede mais próxima, um grande sol.

2 comentários:

  1. O sol pintado é a perfeita subversão da ordem para garantir o sucesso da missão!
    Eu leio como uma vontade pura e infreável de dar certo.

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  2. É nessa tinta amarela que brilham as suas qualidades. Espero que esse girassol saiba enxergá-las como se deve.

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