terça-feira, 6 de maio de 2014

carta ao velho basílio


seu Basílio,

O senhor me deu uma mãe e escolheu meu nome. Além disso, me deu caramelos. Sentado na sua poltrona forrada pelo seu silêncio, vi a sua mão se meter num saco de papel marrom e me estender doces, durante alguns anos. Anos suficientes para que eu não esquecesse o seu rosto. Da sua voz não lembro. Também não sei se o som que sai do meu sopro é o mesmo que saía do seu. Mas guardo o seu instrumento na esperança de que um dia o senhor ainda toque pra mim. Ou comigo. Ou que me escreva uns poemas, como me contam que escrevia. Eu também rabisco, meu velho. Queria poder te mostrar os meus escritos. Mas ocorre que sou dona de palavras inúteis.
Hoje lhe escrevo essa carta porque daí de cima o senhor entende o roteiro das nuvens. Então, hoje lhe escrevo pra dizer que guardo também a sua caneta e o seu carimbo com os seus três pontos de respeito. Quando eu estiver dormindo, venha buscá-los. E me escreva uma resposta: me ensine como seguir.

Sua neta
(há 23 anos sem caramelos)

4 comentários:

  1. Tem um olho na minha lágrima...(vi isso em algum lugar rs.) mas tem sim...
    e não tem como não emocionar com um escrito tão lindo, uma verdadeira pérola sobre seu avô que, com certeza, deixa a mim e seus tios muito orgulhosos!!
    Ele certamente está feliz. Escolheu seu nome e vc o destaca no gosto pela música, os sopros de clarinete, as coisas que vc escreve...exatamente como ele gostava de fazer. O sonzinho do chorinho tocado, me faz lembrar ele. Parabéns! sou orgulhosa de vc. E quando ele vier lhe visitar em sonho, vai assinar com tres pontinhos (da maçonaria), as lembranças que não morrem jamais. A lágrima caiu e fica meu olho brilhando feliz! beijo mamãe.

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  2. Ena ser filha de Mara sempre bela e neta de seu Lélis e D. Binha, é motivo pra que você se orgulhe. Eles foram pessoas boníssimas, eu os adorava.
    Quando vi escrito: Carta a seu Basílio, interessei-me logo em correr os olhos sobre, pois sei da sua imensa capacidade de lidar com as palavras. Também gosto de escrever e amo ver textos bem escritos como os seus. Abraços querida, sou de Riachão e seus pais ,Mara e Xavier, além de Nina , Marcos e Mauro me conhecem bem.

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  3. Uma manhã, cedinho, quando, eu não me lembro mais, porém ficou marcado o som da preocupação de um pai ao perguntar para aqueles três, onde vocês ( Jorge, Venceslau e Gilson Ney) estavam? E cada um deu uma desculpa e Nen, seu filho, com o seu cunhado, naquela época futuro, disseram: Jorge jogou a camisa dele novinha e jogou no mato... ( a história é longa) E o poeta músico, sua clarinete e os papéis, versos, avisos escritos e colados na janela daquele sobradão, começou a rir...
    Adalbio Basilio de Lélis tu fez parte da minha formação e daqui onde não estás mais eu te saúdo com todos os pulmões: PARABÉNS PARA VOCÊ!

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  4. Que lindo... Me fez chorar! Mas choro de emoção boa, saudosa. Vivi um tempo onde o aconchego falava alto! Carinho de pais, tios e avós tinha força dos raios e leveza das plumas.

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